segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

As finanças nacionais...

 

... e o Princípio de Pareto


Vilfrido Pareto foi um economista italiano que, no século XIX, verificou, na sua cidade natal de Florença, que a riqueza estava dividida de tal modo que muito poucas famílias possuíam quase tudo segundo um modelo matemático que se regia por uma lei logarítmica.


Já em meados do século XX, um professor americano J. M. Juran verificava que aquela lei era afinal uma lei geral, aplicável a todo o tipo de gestão, quer da produção, quer da qualidade, quer comercial, quer financeira, quer fiscal, etc..


A aplicação prática desta lei, nomeadamente à vida profissional, permite concentrar os esforços da gestão sobre os assuntos realmente significativos - seja impostos, despesas, receitas, matérias primas, custos empresariais, carteiras de clientes ou produtos vendidos - e conduzir de modo mais aligeirado todos aqueles que para a organização têm um peso negligenciável.

Segundo esta lei, aplicada por exemplo à riqueza de um país, é possível verificar que aproximadamente 20% dos cidadãos vão representar cerca de 80% do valor da riqueza (daí o nome de lei dos 80/20 pelo qual também é conhecida) e vice-versa.

Segundo o modelo actualmente aceite são consideradas quatro classes (que abaixo definiremos) e que, por exemplo, no caso de uma qualquer grandeza permite a divisão do universo em análise em quatro classes (A, sB, B e C) às quais se poderá aplicar, segundo a sua importância, métodos de gestão adequados:

A - Eram os items cujo acumulado representava originalmente 80 % do volume total (definição de Pareto)

Em meados da década de 60 foi considerado útil dividir esta classe e actualmente:


A - Representam os primeiros 50 % do valor global e que corresponderão, em geral a 5% do número total;

sB (Super B) - representam os 30 % seguintes (dando o total original de 80%), correspondendo 15% do número total; em conjunto com os A somam 20% em número e 80% em valor.

B - Itens que representam os 15% seguintes do volume total constituindo 30% do número de indivíduos em análise;

C - Itens que representam os últimos 5% do volume total e que totalizam 50% da população em análise.


Aplicando este conceito aos rendimentos dos contribuintes, teremos:





Fazendo uma representação gráfica (diagrama de Pareto) por número de indivíduos e por rendimento correspondente temos:



Note-se que os valores, tanto em abcissas como em ordenadas,
representam os valores de cada classe e não valores acumulados.
Em qualquer dos casos a soma total é de 100%


Vê-se assim, claramente, a justeza da posição tomada pelo Presidente François Hollande (referida na crónica de 04.Jan.2013) dada a concentração de riqueza nas classes mais altas (A e Super B). Por muito que a estas desagrade, mas num genuíno espírito de solidariedade nacional em tempo de crise.

Note-se, no entanto, que existem dificuldades em determinar os rendimentos das classes mais abastadas já que a riqueza não poderá ser determinada pelas declarações de IRS uma vez que a fuga ao fisco e os rendimentos não declarados ou as contas em paraísos fiscais são o pão-nosso-de-cada-dia destas individualidades.

Vamos, por hipótese, começar por considerar os indivíduos mais ricos de Portugal que, em princípio, rondarão pelos 100.000. Com as respectivas famílias andarão na casa dos 500.000 pessoas, ou seja os 5% da classe A do diagrama de Pareto, detentores de 50% dos rendimentos nacionais.

Dentro desta classe, tal como na Super B que com ela totalizam os 80% dos rendimentos, haverá três tipos de indivíduos que se elevaram a essa abastança por meios distintos:


  • Os que herdaram essas riquezas, sendo por isso originários de famílias tradicionalmente abastadas e que por isso partilham valores de ética e de dignidade.

  • Os que ascenderam a elas por mérito próprio, seja por inteligência, competência, trabalho, esforço pessoal e que valorizam princípios concordantes com o esforço que realizaram.

  • Todos os outros que se alcandoraram a essas alturas, fruto de manobras sombrias, de jogos de poder, de corrupção, de compadrios, de jogadas na Bolsa, de burlas e sabe-se lá que mais... e que, dada a génese das suas fortunas e a sua falta de escrúpulos, não têm qualquer respeito pelos seus semelhantes, valorizando apenas os seus interesses pessoais e nada mais.

Os dois primeiros casos serão potencialmente sensíveis a um sacrifício temporário dos seus rendimentos numa base de justiça e de equanimidade de tratamento por parte de quem governe eticamente o País.

Os últimos não terão a menor contemplação pelo interesse geral, como será mais do que evidente e será muito difícil obter qualquer acordo a favor de um bem comum. Estes terão a maior parte das suas fortunas em paraísos fiscais (Ilhas Cayman, Hong Kong, Bahrain, Singapura, entre outros…) de onde as Finanças não conseguirão taxar-lhes as verbas que eles lá colocaram.

Bem, mas para que servirá toda esta exposição?

Algo de muito simples: para demonstar que as modestas medidas tomadas pelo Governo, sobrecarregando uma vez mais as classes médias e baixas (que, mau grado o seu número, representam apenas uns irrisórios 20% da riqueza do país), continuam a deixar escapar incólumes as grandes fortunas que, por si sós, poderiam garantir uma colecta substancial para resolver a solvência de Portugal. Porque poucos imaginam os valores que elas alcançam...

Ao contrário do que fez o Presidente François Hollande...!

Pensem nisso. Até amanhã!


P.S. Esta crónica foi-me inspirada pelas dúvidas de uma jovem colega que não percebia como colectar significativamente os 100.000 mais ricos poderia resolver o nosso problema da dívida nacional. Espero que tenha ficado esclarecida. Felicidades.



 

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